Dando seguimento ao último post, e tendo já eu decifrado, julgo eu, algumas das partes mais afectadas do diário, escrito sob a forma de cartas, venho aqui colocar ao vosso dispor a primeira entrada, chamemos-lhe assim, do diário. Sempre que apareçam reticências ou parêntesis rectos, significa que não consegui compreender o que estava escrito e decidi não fazer conjecturas, por forma a ser o mais fiel possível ao achado. Espero que sejam do vosso agrado.
«Algures, 24 de Agosto .........,
Minha querida,
Não sei que horas serão, pois começo a perder o rasto ao tempo, ao tempo cronológico, já que quanto ao físico, começa a estar bem vincado no meu corpo e na minha alma, uma vez que nesta situação de privação, os limites do meu corpo são também os meus, já me valendo de pouco o raciocínio e a razão.
Agora que passaram cerca de 30 dias, acho eu, desde que nos vimos pela última vez, antes de ter partido para esta viagem absurda, e aproveitando tudo o que tenho à mão passível de ser utilizado, decidi escrever-te prevenindo o facto de poder não ser resgatado a tempo. Sim, concordo, sei que tudo isto poderá nunca ser encontrado, mas também sei que não posso ficar aqui inerte sem fazer nada, para além do que, numa situação de desespero, ou na iminência do mesmo, toda a nossa alma aponta para a pessoa que amamos, tal como se fosse o nosso anjo da guarda. Do mesmo modo, não quero deixar nada por dizer, pois posso não ter outra oportunidade ou meio de fazê-lo. Não estranhes contudo não teres muito que ler a cada carta, ou se as datas forem muito espaçadas, é que o cansaço e o desânimo são muito fortes e tiram-me as forças para meditar e raciocinar e bem sabes tu o quão gosto de fazer ambas.
Como deves saber, o acidente aconteceu bem pouco depois de nos termos despedido naquela noite. Foi uma tempestade tão forte, quão inesperada, de tal ordem, que nada valeram os esforços para manter o barco a navegar. Foi como se o mesmo tivesse sido atingido por tiros de peça de artilharia, tal como as que eram usadas nas ferozes batalhas do Pacífico, durante a Segunda Guerra mundial. No meio do caos, consegui fugir com algumas coisas para dentro de um pequeno salva vidas e aqui ando há já cerca de 30 dias, perdido nesta imensidão azul. Tenho avistado uma ilha ao longe, julgo eu, pois não ponho de parte a hipótese de serem alucinações, da qual me aproximo e afasto conforme o sabor da corrente, pois não me encontro em condições de fazer muito contra essa aleatoriedade. Assim, vou aguardando na esperança de que o vento ou uma maré favorável me conduza a bom porto, até porque a água doce começa a escassear.
Por hoje fico-me por aqui, pois foi um dia intenso, de muitas lembranças e saudades. Mesmo com os lábios ressequidos pelo sol e pelo sal, dava tudo para poder fechar os olhos e sentir o toque suave dos teus lábios nos meus. Sonho, eu sei, mas que mais me resta estando eu perdido nesta imensidão e com pouca certeza do rumo que levo!?
Estou cansado, muito cansado [....]. Até breve, se Deus assim o entender.
PS: Meu amor, para que saibas tu e só tu que sou eu e quem sou eu, assino com as iniciais do nome que escolhemos para a nossa filha, ML.»
Espero em breve publicar a segunda entrada.
Não sei que horas serão, pois começo a perder o rasto ao tempo, ao tempo cronológico, já que quanto ao físico, começa a estar bem vincado no meu corpo e na minha alma, uma vez que nesta situação de privação, os limites do meu corpo são também os meus, já me valendo de pouco o raciocínio e a razão.
Agora que passaram cerca de 30 dias, acho eu, desde que nos vimos pela última vez, antes de ter partido para esta viagem absurda, e aproveitando tudo o que tenho à mão passível de ser utilizado, decidi escrever-te prevenindo o facto de poder não ser resgatado a tempo. Sim, concordo, sei que tudo isto poderá nunca ser encontrado, mas também sei que não posso ficar aqui inerte sem fazer nada, para além do que, numa situação de desespero, ou na iminência do mesmo, toda a nossa alma aponta para a pessoa que amamos, tal como se fosse o nosso anjo da guarda. Do mesmo modo, não quero deixar nada por dizer, pois posso não ter outra oportunidade ou meio de fazê-lo. Não estranhes contudo não teres muito que ler a cada carta, ou se as datas forem muito espaçadas, é que o cansaço e o desânimo são muito fortes e tiram-me as forças para meditar e raciocinar e bem sabes tu o quão gosto de fazer ambas.
Como deves saber, o acidente aconteceu bem pouco depois de nos termos despedido naquela noite. Foi uma tempestade tão forte, quão inesperada, de tal ordem, que nada valeram os esforços para manter o barco a navegar. Foi como se o mesmo tivesse sido atingido por tiros de peça de artilharia, tal como as que eram usadas nas ferozes batalhas do Pacífico, durante a Segunda Guerra mundial. No meio do caos, consegui fugir com algumas coisas para dentro de um pequeno salva vidas e aqui ando há já cerca de 30 dias, perdido nesta imensidão azul. Tenho avistado uma ilha ao longe, julgo eu, pois não ponho de parte a hipótese de serem alucinações, da qual me aproximo e afasto conforme o sabor da corrente, pois não me encontro em condições de fazer muito contra essa aleatoriedade. Assim, vou aguardando na esperança de que o vento ou uma maré favorável me conduza a bom porto, até porque a água doce começa a escassear.
Por hoje fico-me por aqui, pois foi um dia intenso, de muitas lembranças e saudades. Mesmo com os lábios ressequidos pelo sol e pelo sal, dava tudo para poder fechar os olhos e sentir o toque suave dos teus lábios nos meus. Sonho, eu sei, mas que mais me resta estando eu perdido nesta imensidão e com pouca certeza do rumo que levo!?
Estou cansado, muito cansado [....]. Até breve, se Deus assim o entender.
PS: Meu amor, para que saibas tu e só tu que sou eu e quem sou eu, assino com as iniciais do nome que escolhemos para a nossa filha, ML.»
Espero em breve publicar a segunda entrada.
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