quinta-feira, dezembro 04, 2014

Bola de Ouro 2014




Manuel Neur
in http://www.abola.pt/nnh/ver.aspx?id=516547

Não ligo muito a isto, mas Ronaldo irá ganhar sem sombra de dúvidas, e com toda a justiça, isto apesar de considerar que em qualquer competição, só no fim se sabe quem ganha. Contudo esta parece não poder fugir, nem poder, nem dever.

No entanto, por outro lado, porque nos parece tão absurdo um médio, um defesa ou um guarda-redes, aspirar a ganhar um prémio deste quilate? A mim não parece, de todo. Buffon, Andrea Pirlo, Michael Ballack, Lothar Matheus - este chegou a ganhar - Frank Lampard, Totti, Paolo Maldini, o próprio "Carleto", enfim, uma panóplia de jogadores de grande classe.

E Manuel Neur!? É fabuloso, fabuloso, abriu em definitivo um novo espaço para o guarda-redes - verdadeiramente o 11º Jogador - no futebol do presente e do futuro. Acredito que até a formação de guarda-redes já está a influenciar.

Quanto a ganhar isto? Difícil, muito difícil, até pela "estratosférica" qualidade dos rivais, mas Neuer é também um estratosférico, sem dúvida. Recordo o seu profissionalismo no Mundial (frente ao Brasil) os primeiros 10/15 minutos da segunda parte, com o resultado em 0-5 para Alemanha. Louvável a qualidade das defesas e a postura, postura essa que nos colegas tinha equivalido aos 0-5 até ao momento. 

terça-feira, dezembro 02, 2014

Cartas de um Naufrago - Epilogo







Boa noite, 

Após uns logos 5 anos de árduo trabalho, avanços e recuos, apresentei a última carta do nosso naufrago, melhor, não se pode dizer que tenha sido a última no sentido físico, mas antes no sentido de que não consigo discernir mais nada daquilo que se me apresenta à minha frente. Para mim, trata-se apenas de uma massa de papeis, disforme, indecifrável. Contudo, aquela que defini como última, parece-me a mim ter sido mesmo a última, até pelo seu conteúdo, se bem que não não há qualquer forma de saber quando a garrafa foi jogada ao mar, pois pode muito bem ter sido lançada durante a suposta viagem de regresso ou até mesmo depois desse regresso. Tais considerações estão para além das minhas capacidades. Talvez o próprio, se por algum acaso se cruzar com estas linhas, possa um dia revelar o que de facto de passou.

Tentei com todo o meu engenho, limitado por natureza, decifrar os escritos, sendo que muitos deles se encontravam, e encontram, num estado lastimável, quase impossíveis de manusear. Não acrescentei nada ou adaptei. Está apenas publicado o que consegui compreender.
Sito o autor na despedida:

"Aceito a condição de naufrago, recusando a condição de naufragado. Órfão de ti, órfão de nós -reconhecendo a condição de que tudo morre, mas que nada nos deixa - como progenitor da minha própria vida, parto como navegador solitário, a condição por excelência do ser humano, em busca do porto de abrigo, em busca de ti."

Lisboa, 02 de Dezembro de 2014


Cartas de um Naufrago - 10ª e última entrada Entrada

 
Wanderer Above the Sea of Fog,
Casper, David Friedrich  

 «É [...] final da tarde. O mar está calmo, corre uma pequena brisa que espero que seja suficiente para enfunar a vela e me levar daqui. Os trapos que me cobrem o corpo anunciam que é hora de partir, pois já me sinto de mim para mim uma memória. Vejo-me como um espaço-tempo já percorrido, sinto-me como se me estivesse a ver num quadro, a ler num livro, impressão morta, terreno pisado e repisado. É hora de partir, arriscar e partir, é hora de recuperar o ser do humano, é hora de navegar e colocar o cuidado do lado do risco.

Desde a nossa alvorada que não somos mais que horizontes de memória, memória em constituição. Da memória dos sentires do ventre, aos primeiros passos, quedas e conquistas, uma constante de referências passadas entre-cortadas por imagens do presente já ido perspetivando um presente que poderá vir. Somos sempre imagem e reflexo, imagem do que foi, reflexo do e no que se que mostra e do e no que se mostrará. Partimos de um nada, para nos constituirmos num nada. Dimensionalmente finitos, constitutivamente possíveis.

E aqui, que sou eu? Menos que memória, traços, esquissos, sem ligação, impossíveis de se fixar neste aleatório, vácuo de ser, sem correspondência, sem raízes ou ramos. Desligado de tudo, não me ligo a nada. Não há opção só condicionamento, um indeterminismo determinado pela circunstância, não de se ser assim ou de outra forma, mas de se estar assim. Um ir sendo para lado nenhum. Estou como um prisioneiro, embora aparentemente livre. Se é um facto que não podemos nunca dizer que somos verdadeiramente livres, porque não o somos, também não é menos verdade que sem laços, sem ligações, desprendidos, aparentado uma suma e verdadeira liberdade - a do ermita - continuamos igualmente presos. É como me sinto, nesta ilha chamada Eu, onde podendo tudo, não posso nada para além do básico. Não há ligação, reflexo, ou registo, elo, nada. Podendo ser tudo, não sou nada. Sobrevivo. 

A vida é a marca do exercício da liberdade e a liberdade a marca do exercício da vida, cama que se faz no constituir do Si. Aqui, nada se constitui, o possível tudo representa o nada, despojado que está do ser do Humano. A liberdade tornou-se uma prisão.
[...]
Está na hora. Esta ausência de balizas está a consumir-me. Não tenho plano para lá do suspiro pós ação.
[...]
Está pronto, está tudo pronto. Um último olhar da falésia sobre a minha obra, ela também um reinventar de mim. Uma amálgama de materiais, veiculo da libertação, seja ela para a morte ou para o regresso à vida, a "mão tijolo" que fez obra. Está na hora de partir, tendo eu forças ou não para tal. Tendo que não tendo, eu sou a força, aliás tenho de ser o que tiver de ser, pois o meu ser constituir-se-á na minha resistência e capacidade para a minha obra, para o meu exercício. Assim, a um tempo explorador e cuidador,  aceito a condição de naufrago, recusando a condição de naufragado. Órfão de ti, órfão de nós -reconhecendo a condição de que tudo morre, mas que nada nos deixa - como progenitor da minha própria vida, parto como navegador solitário, a condição por excelência do ser humano, em busca do porto de abrigo, em busca de ti.

[...]
Até já, sempre teu.
ML»