A música, o elogio da música. É algo que há muito quero fazer, mas sempre achei que não conseguia escrever algo de relevante, que traduzisse o que queria verdadeiramente dizer. Ao dizer sempre achei - passado - não se pense que já não acho o mesmo, mas resolvi arriscar.
Tenho tido o prazer de assistir a algumas bandas ao vivo e tem sido verdadeiramente fantástico. Adoro música, a mesma transporta-me para fora de mim, para outro mundo, sem idade, sem tempo, sem convenções - parabéns aos P´laguita. Assim, neste sentido, vou usar aqui - não literalmente - algumas considerações de Aquino.
Tomás d´Aquino disse que a música era um demónio, uma das coisas mais perniciosas para o ser humano, pois tinha o poder de transportá-lo do céu ao inferno e vice-versa com a simples mudança de uma nota, de um andamento. Um existencialista este homem, alguns séculos antes do mesmo emergir. A música incide sobre as nossas disposições de forma violenta, transportando a nossa existência para um estado paradisíaco, de quase divindade e perfeição - onde nada nos parece poder afectar - quer para o estado inverso, isto é, depois de uma existência estilhaçada, quer por um facto quer por muitos, a mesma traduz esse mesmo estar de forma vincada, como uma máquina que repetisse sem parar, ritmadamente, de forma doce, um estado de caos, de perda, de derrota. A música pára o tempo, e neste sentido identifica-o como tal, isto é, como tendo a capacidade de prolongar um minuto por toda uma vida, numa cadência angustiante e dilaceradora. Ela é amor, paixão, ódio, desespero, raiva, angústia, melancolia, saudade - essa chaga viva. E nós gostamos, e ouvimos e repetimos e no meio de tudo, pela voz da tristeza, conseguimos voltar a sonhar, a sorrir, a acreditar. É de facto um demónio, um embelezador da própria ilusão, da vida, desta ilusão de um instante.
Todos nós temos grupos e cantores favoritos. Eu tenho muitos, muitos mesmo, mas existem algumas músicas que nos tocam especialmente. De Mozart com a sua Masonic Funeral Musica, K. 477, com as maravilhosas árias das Bodas de Figaro, de Chopin com as suas nocturnas, de Pink Floyd com o seu Wish You Were Here, a Jorge Palma, Clã, a grande Amália, enfim, nesta infinidade, escolho duas Músicas que me fazem sentir precisamente aquilo que tão humildemente tentei explicar, isto é, a queda do mundo e a Subsequente perda. Receber a vida nos braços é isso mesmo, é ficar perdido. É isto que a Filosofia faz, é isto que nos faz perceber, uma posição que é isso mesmo e da qual não há fuga, tal como se estivéssemos eternamente frente a um espelho a acompanhar até ao fim o nosso envelhecimento. Auto-estrada sem portagens, jogo de futebol sem segunda parte.
Bom, escolhi duas músicas de duas bandas que retratam - no meu ponto de vista - a existência de forma sublime, cheias de metafísica, de existência, de busca, de inquietação. Como diz um excerto de uma música de uma das bandas: "Foi só mais um dia mau."
Ornatos Violeta e Madredeus, Chaga e Alfama, respectivamente. Deixo-vos as letras e espero que quem não conhece procure ouvi-las. Para mim são tudo. Como diz o título do segundo e último álbum - infelizmente - dos Ornatos Violeta, o monstro precisa de amigos.
Chaga
(Cruz/Peixe, Cruz)
foi como entrar
foi como arder
para ti nem foi viver
foi mudar o mundo
sem pensar em mim
mas o tempo até passou
e és o que ele me ensinou
uma chaga pra lembrar que há um fim
diz sem querer poupar meu corpo
eu já não sei quem te abraçou
diz que quando eu senti teu corpo sobre o meu
quando eu cair
eu espero ao menos que olhes para trás
diz que não te afastas de algo que é também teu
não vai haver um novo amor
tão capaz e tão maior
para mim será melhor assim
vê como eu quero
e vou tentar
sem matar o nosso amor
não achar que o mundo é feito para nós
foi como entrar
foi como arder
para ti nem foi viver
foi mudar o mundo
sem pensar em mim
mas o tempo até passou
e és o que ele me ensinou
uma chaga pra lembrar que há um fim
Alfama
(P.A.Magalhães/Rodrigo Leão)
Agora
que lembro
As horas ao longo do tempo
Desejo
Voltar
Voltar a ti
desejo-te encontrar
Esquecida
em cada dia que passa
nunca mais revi a graça
dos teus olhos que amei
Má sorte
foi amor que não retive
e se calhar distraí-me
qualquer coisa que encontrei
Ornatos Violeta e Madredeus, Chaga e Alfama, respectivamente. Deixo-vos as letras e espero que quem não conhece procure ouvi-las. Para mim são tudo. Como diz o título do segundo e último álbum - infelizmente - dos Ornatos Violeta, o monstro precisa de amigos.
Chaga
(Cruz/Peixe, Cruz)
foi como entrar
foi como arder
para ti nem foi viver
foi mudar o mundo
sem pensar em mim
mas o tempo até passou
e és o que ele me ensinou
uma chaga pra lembrar que há um fim
diz sem querer poupar meu corpo
eu já não sei quem te abraçou
diz que quando eu senti teu corpo sobre o meu
quando eu cair
eu espero ao menos que olhes para trás
diz que não te afastas de algo que é também teu
não vai haver um novo amor
tão capaz e tão maior
para mim será melhor assim
vê como eu quero
e vou tentar
sem matar o nosso amor
não achar que o mundo é feito para nós
foi como entrar
foi como arder
para ti nem foi viver
foi mudar o mundo
sem pensar em mim
mas o tempo até passou
e és o que ele me ensinou
uma chaga pra lembrar que há um fim
Alfama
(P.A.Magalhães/Rodrigo Leão)
Agora
que lembro
As horas ao longo do tempo
Desejo
Voltar
Voltar a ti
desejo-te encontrar
Esquecida
em cada dia que passa
nunca mais revi a graça
dos teus olhos que amei
Má sorte
foi amor que não retive
e se calhar distraí-me
qualquer coisa que encontrei